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Um novo capítulo na novela do creditamento do PIS e da Cofins

por Ana Carolina Moreira Garcia e Maysa Pittondo Deligne

O ano de 2023 mal começou e já tivemos uma série de normas publicadas pelo novo governo, bem como algumas publicadas pela Receita Federal no apagar das luzes de 2022, que nos trouxeram alterações significativas na apuração do PIS e da Cofins, em especial a Instrução Normativa nº 2.121/2022 e a Medida Provisória nº 1.159/2023. Curioso é que essas alterações, que tem como objetivo declarado trazer maior segurança jurídica para os contribuintes e diminuir a complexidade, geraram apenas mais confusão e dúvidas, além de trazer também um novo enfoque, uma mudança significativa na sistemática da não cumulatividade do PIS e da Cofins, até então delineada pelo legislador e pelo Judiciário.

Desde o início da legislação do PIS e da Cofins não cumulativos, grande parte dos operadores do direito e dos contribuintes já defendia que a não cumulatividade não é a mesma do IPI e do ICMS. Diferentemente desses impostos, os créditos do PIS e da Cofins não são créditos escriturais, pelo montante do tributo destacado na etapa anterior, mas sim por meio da aplicação das alíquotas das contribuições sobre o valor das despesas e custos necessários para colocar o bem a venda ou para possibilitar a prestação de serviços, desde que a operação anterior fosse sujeita ao pagamento das contribuições. Esse conceito se aproxima mais do conceito de despesa operacional trazido pela legislação do imposto de renda, aliás, essa é uma discussão ainda não pacificada pelos tribunais, ainda que se tenha alguns indícios de que não seria uma não cumulatividade tão ampla a ponto de possibilitar o creditamento sobre todas as despesas que podem ser consideradas como dedutíveis para fins apuração do imposto de renda pelo lucro real.

Após intensos debates, encontra-se hoje pacificado na jurisprudência, nos termos do julgamento do REsp nº 1.221.170-PR que o sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da Cofins, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 não se assemelha ao regime não cumulativo do ICMS e do IPI; e que o conceito de insumo para fins de creditamento dessas contribuições deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item — bem ou serviço — para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

O que se vê agora após a publicação da IN nº 2121/2022 e da MP nº 1.159/2023 é que não basta a operação anterior estar sujeita à tributação pelo PIS e pela Cofins, mas o valor que foi considerado como base de cálculo do PIS e da Cofins pelo fornecedor é que passa ser a referência para a apuração do crédito pelo adquirente. Trata-se de uma alteração significativa na sistemática até então vigente, de forma que contribuinte precisará excluir parte do valor que foi efetivamente pago para aquisição de uma mercadoria para revenda, por exemplo.

Em outras palavras, o crédito não será mais determinado mediante a aplicação das alíquotas de PIS e Cofins sobre o valor dos bens para revenda e dos insumos adquiridos no mês, conforme determina o §1º, inciso I do artigo 3º da Lei nº 10.833/2003. A rigor, desde o dia 20 de dezembro de 2022, data de publicação da IN, tanto o ICMS ST, quando cobrado pelo vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário, quanto o IPI incidente na venda do bem pelo fornecedor; por serem parcelas do valor de aquisição dos itens não sujeitas ao pagamento da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins por parte do vendedor não geram direito a crédito, devendo ser excluídos da base de cálculo dos créditos. Essa alteração pode provocar um efeito muito significativo na apuração dos tributos, principalmente no caso de bens e mercadorias que possuam alíquotas de IPI elevadas, além de não ser possível precisar com exatidão quais seriam as parcelas exatas que entende a RFB que devem ser excluídas, pois, o caput do artigo 170 da nova IN traz a expressão “tais como”, o que não é taxativo, e sim exemplificativo.

Ressalte-se que a IN anterior, a de nº 1.911/2019 em seu artigo 167, resguardava expressamente o direito ao aproveitamento do valor do IPI incidente na aquisição, quando não recuperável, por integrar o valor de aquisição, para efeitos de cálculo dos créditos decorrentes da aquisição de insumos, bens para revenda ou bens destinados ao ativo imobilizado, perfeitamente em linha com legislação de regência.

Quanto ao ICMS-ST destacado pelo fornecedor, a IN 1.911/2019 era silente sobre a possibilidade ou não de seu aproveitamento como parcela integrante do valor de aquisição. Contudo, não podemos nos esquecer que, em decisão proferida em meados de 2022 (AgInt no Recurso Especial nº 1525939/PR), a 1ª Turma do STJ, por unanimidade, reconheceu que prevalece a compreensão de que o ICMS-ST constitui parte integrante do custo de aquisição da mercadoria e, por conseguinte, deve ser admitido na composição do montante de créditos a ser deduzido para apuração da Contribuição ao PIS e da Cofins, no regime não-cumulativo, independentemente da incidência das mencionadas contribuições sobre o tributo estadual recolhido pelo substituto na etapa anterior.

Por fim, não menos importante, a alteração trazida pela MP nº 1.159/2023, que se convertida em Lei, passará a valer a partir do dia 01 de maio de 2023, vedando o direito ao crédito sobre o valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição.

Portanto, percebe-se que estamos diante de um novo capítulo na novela do PIS e da Cofins, em que temos um posicionamento do Poder Executivo via Medida Provisória e da Receita Federal via Instrução Normativa quanto à sistemática de creditamento das contribuições, indo em um sentido diametralmente oposto ao que até então vinha sendo desenhado pela jurisprudência, principalmente do STJ. E aí, o que vai prevalecer? Precisamos entender como fica o contribuinte nessa história.

*Artigo publicado originalmente no ConJur: https://www.conjur.com.br/2023-fev-18/garciae-deligne-nao-cumulatividade-pis-cofins2

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